sábado, 21 de fevereiro de 2009

Noites sem ti


Quando o silêncio da noite me atormenta
E pensamentos de um amor me invadem
Perco-me em curvas e trilhas
E nelas não vejo tuas mãos.
Somente meu olhar perdido
à procura de algo palpável
que possa transmitir o calor
O amor que tanto esperei.
Teu vulto, uma sombra fria,
Observa...
Sem querer suspeitar presença
Apenas espreita
Murmura,
Pensa e, trancado em palavras,
Desaparece deixando-me perdida e
Só em meus pensamentos.
A noite parece mais fria
Cheia de medos e lamentos.
Recolho minhas dores
Busca de pedaços de momentos
Acalentado numa saudade eterna.
Os dias passam
As noites frias retornam
E com elas todo esse vazio imenso
Toda uma saudade que consome.
Por vezes me pergunto, quem sou eu?
Pois tantas foram as vezes
que saí de mim para ser outro alguém.
Sou metade de mim
Sou pedaço de mim
Onde meu todo se perdeu.
***
(Tânia Carvalho)

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Encantamento


Vi as mulheres azuis do equinócio
voarem como pássaros cegos;
e os seus corpos sem asas afogarem-se,
devagar, nos lagosvulcânicos.
Os seus lábios vomitavam o fogo
que traziam de uma infância de magma calcinado.
A água ficava negra, à sua volta;
e os ramos das plantas submersas pelas chuvas primaveris
abraçavam-nas, puxando-as num estertor de imagens.
Tapei-as com o cobertordo verso;
estendi-as na areia grossa da margem,
vendo as cobras de água fugirem por entre os canaviais.
Espreitei-lhes o sexo por onde escorria o líquido branco de um início.
Pude dizer-lhes que as amava,
abraçando-as, como se estivessem vivas;
e ouvi um restolhar de crianças por entre os arbustos,
repetindo-me as frases com uma entoação de riso.
Onde estão essas mulheres?
Em que leito de rio dormem os seus corpos,
que os meus dedos procuram num gesto vago de inquietação?
Navego contra a corrente;
procuro a fonte, o silêncio frio de uma génese.
**
(Nuno Júdice)

domingo, 15 de fevereiro de 2009

O ponto de partida


Será este o ponto de partida,
obscuridade incerta
e sobre o fundo sombrio da morte?
A esperança nascerá deste branco vazio
e desta mão de cinza?
O viajante entrou num barco ou numa árvore
que o soergue, ainda hesitante, na imensidade
de uma sombra de astro.
Ele aproxima-se de formas vagas,
de espelhos entre pedras,
e junto a um muro sob as estrelas
uma figura de orvalho descalça sobre as ervas.
Tudo flutua ainda, dentro da poeira azul
e púrpura e tudo está esparso e reunido
como na primeira consciência deste mundo
tão longínquo e tão presente
como se o sol fosse um perfume
que da montanha descesse sobre as palavras ditas.
**
(António Ramos Rosa)

sábado, 14 de fevereiro de 2009

O sal da língua


Escuta, escuta:
tenho ainda uma coisa a dizer.
Não é importante, eu sei,
não vai salvar o mundo,
não mudará a vida de ninguém -
mas quem é hoje capaz de salvar o mundo
ou apenas mudar o sentido
da vida de alguém?
Escuta-me, não te demoro.
É coisa pouca, como a chuvinha
que vem vindo devagar.
São três, quatro palavras, pouco mais.
Palavras que te quero confiar,
para que não se extinga o seu lume,
o seu lume breve.
Palavras que muito amei,
que talvez ame ainda.
Elas são a casa, o sal da língua.
**
(Eugénio de Andrade)

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Uma Mulher


Um resto de Agosto.
Uma mulher conhece
o caminho da fonte
porque o seu corpo
é um desvio do mar.
Talvez ela nos mostre
um céu líquido
por detrás dos seus ombros.
Não só as mãos morrem
fatigadas de desejo.
Há cascatas de pedra
nos olhos da memória.
**
(Graça Pires)

Nunca mais


Nunca mais
Caminharás nos caminhos naturais.
Nunca mais te poderás sentir
Invulnerável, real e densa -
Para sempre está perdido
O que mais do que tudo procuraste
A plenitude de cada presença.
E será sempre o mesmo sonho, a mesma ausência.
**
(Sophia de Mello Breyner Andresen)

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Vens de noite no sonho


Vens de noite no sonho
sem pés
entre páginas
de gasta paciência
quando a música findou
e teu sorriso se desfez
como um grão de pólen.
*
Vens no veneno oculto
de meus dias
no silêncio
dos meus ossos
devagar
arrastando em queda
o nosso mundo.
*
Vens no espectro
da angústia
na escrita
inquieta
destes versos
no luto maternal
que me devolve a ti.
*
A escuridão desce então
sobre o meu corpo
quando o rosto da morte
adormece na almofada.
**
(Ana Marques Gastão)

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Chove!


Chove…

Mas isso que importa,

se estou aqui abrigado nesta porta

a ouvir a chuva que cai do céu

uma melodia de silêncio

que ninguém mais ouve

senão eu?

*
Chove…

Mas é do destino

de quem ama

ouvir um violino

até na lama.

**

(José Gomes Ferreira)

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Na espera do verso...


Nos vértices da paixão está o que sinto
e nela as arestas não encontro
derramo-me no mel e não te minto
antes sofregamente te pressinto
e me dou
*
E o meu corpo transforma-se em papel
e nas palavras que escreves
me alimento
*
E é no sumir do tempo que eu me escondo
e na espera do verso que eu sou
Resguardo-me apenas do que é eterno
e sorvo o momento do efémero
No instante
em que te dás e que me dou
*
E cresco assim em horizonte
ao longe
mas no mais perto que sou
amando...
(Cris)

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Vou fazer amor contigo


Vou fazer amor contigo esta noite
como se fosse uma deusa
que nasceu para te amar...
Vou dançar no teu corpo num bailar de véus
e de sentidos até já não haver céu...
*
Vou levar-te a passear por entre as estrelas
num trilho de abraços e de luar
E prolongar os meus braços ao sal da tua pele
quando os meus lábios tocarem os teus
E as tuas mãos não souberem mais
como ocultar os teus anseios...
*
E os meus seios vão chamar pela lua
e pelos ventos e até pelas ondas do mar
Do ondular da tua língua
no epicentro do universo da minha vontade
e dos teus desejos...
Vou dançar este amor contigo
numa ilha sem nome ao som dos sussurros
que os teus lábios não conseguem guardar
*
E vou ouvi-los em forma de gemidos
entrelaçados no som do mar...
E ao arquejar do meu corpo,
a cada compasso dessa melodia que vamos cantar...
Saberás que te amo mais que à vida
e que dançarei até ao fim...
*
E de ti soltarás a nascente de fogo e de vida
que desaguará em mim...
E, de seguida...
estenderás os braços num abraço
para que adormeça em ti!
E eu sentirei o beijo
com que fechas as cortinas
da noite em que fiz amor contigo assim...
Amo-te!
(Cris)

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Poemas?



Na noite dos mil poemas
inventei em mim as palavras
que me ensinaram a amar...

Descobri um mar de conceitos,
procurei lá os meus defeitos
e desatei a poetar...
Poemas...

Criei poemas...
Inventei teoremas
cruzei, inverti,
mas sobretudo sonhei as palavras
que são uma parte de mim...

De cada poro que tenho
saiu um pouco de sumo,
do meu cigarro foi o fumo,
e da minha alma o sentir...

Depois foi apenas
sonhar...
Usar os dedos...
Criar!

São poemas o que criei?
Decididamente, não sei...
Mas são uma parte de mim!...

(Cris)