
Dizem-me que vai haver dias novos
Que hão de vir buscar-me
e arrastar-me por caminhos que não sei
ainda
Dizem-me que tem de ser
Mas eu
meu amor
que só conheço o tempo dos teus dedos
o tempo que se demoram na inclinação perfeita
do pensamento
[Nome que dei às sombras que te ponteiam
Nome do cheiro da tua vinda
e do tato solto dos teus olhos
sobre a promessa de mim]
eu
meu amor
sei
que não há passagem que nos valha
Sei que levarei
lágrimas embrulhadas neste ter de ser
e uma tempestade de punhos lavados
à espera de um sangue
que se demora
nos degraus do vapor que te sou
subindo-me
subindo-me e levando-te
na transparência dolente deste cansaço
de me tardares
indefinidamente
Dizem-me que vai haver dias novos
para sepultar tudo o que demorou
de mais
e não chegou a chegar
Dizem-me que tem de ser
Mas respiras-me
ainda
e temo que me morras
vivo
e que vivendo-me
me deixes ainda pulsando
a entardecer-te
indefinidamente
Porque eu sei
meu amor
que o tempo dos teus dedos
não passa
***
(Virgínia do Carmo)