quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Flores de cactus


Flores de cactus resplandecentes,
Espelhantes, encarnadas!
Rubras gargalhadas
De cortesãs…
Embriagam-se de sol,
Pelas doiradas manhãs,
Viçosas e ardentes!
Bela flor imprudente!
Brilha melhor o sol rutilante
Nas suas pétalas vermelhas…
É sugestivo
O ar insolente e petulante,
Como se deixam morder
Pelas doiradas abelhas!
Nascem para ser beijadas
E possuídas
Pelo sol abrasador…
Lascivas,
Predestinadas
Para os mistérios do amor!
Eu gosto desta flor pagã
E sensual,
Que num místico ritual
Se entrega toda aberta
Aos beijos fulvos do sol!
Oh! Flor do cactus enrubescida!
No teu vermelho, há sangue, há vida…
- E eu tenho uma enorme sede de viver!
***
(Judith Teixeira)

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

SONETO LXXXVIII


Quando me tratas mau e, desprezado,
Sinto que o meu valor vês com desdém,
Lutando contra mim, fico a teu lado
E, inda perjuro, provo que és um bem.
Conhecendo melhor meus próprios erros,
A te apoiar te ponho a par da história
De ocultas faltas, onde estou enfermo;
Então, ao me perder, tens toda a glória.
Mas lucro também tiro desse ofício:
Curvando sobre ti amor tamanho,
Mal que me faço me traz benefício,
Pois o que ganhas duas vezes ganho.
Assim é o meu amor e a ti o reporto:
Por ti todas as culpas eu suporto.
***
(William Shakespeare)

sábado, 25 de outubro de 2008

Seus olhos


Seus olhos - se eu sei pintar
O que os meus olhos cegou
Não tinham luz de brilhar.
Era chama de queimar;
E o fogo que a ateou
Vivaz, eterno, divino,
Como facho do Destino.
*
Divino, eterno! - e suave
Ao mesmo tempo: mas grave
E de tão fatal poder,
Que, num só momento que a vi,
Queimar toda alma senti...
Nem ficou mais de meu ser,
Senão a cinza em que ardi.
***
(Almeida Garret)

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Desejo


Ah! que eu não morra sem provar, ao menos
Sequer por um instante, nesta vida
Amor igual ao meu!
Dá, Senhor Deus, que eu sobre a terra encontre
Um anjo, uma mulher, uma obra tua,
Que sinta o meu sentir;

Uma alma que me entenda, irmã da minha,
Que escute o meu silêncio, que me siga
Dos ares na amplidão!
Que em laço estreito unidas, juntas, presas,
Deixando a terra e o lodo, aos céus remontem
Num êxtase de amor!
(Gonçalves Dias)

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Era fácil


Era fácil sair de mim
e colher o prazer.
Mas conto os dias,
as horas,
os segundos
nem sei para quê.
Acredito, não sei porquê,
que esta angústia,
esta dor,
esta ferida,
se esvai,
se adoça,
se cura.
Que este sentir não dura.
Mas os dias passam,
a angústia aperta,
a dor cresce,
a ferida afunda
e tudo à minha volta
sucumbe cinzento,
sem um alento,
no meu desvario
que me preenche,
me inunda.
(Helena Guimarães)

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Solidão


Não mais fujas de mim, ó minha amiga,
para sempre fiques guardada no meu peito,
Que me acompanhes nas noites em que me deito,
sempre que de dia a minha alma é vencida.
*
Juntos no mesmo mundo, no mesmo leito,
todo o teu conforto será a minha guarida,
assim teremos a vida de nos esquecida,
seremos a divina união, o casal perfeito.
*
E juntos neste singular exilio, vamos viver,
guardar todas as mágoas no meu coração,
como reliquias que para sempre vou esconder.
*
Serei de todos os mortais, o mais feliz então,
por este tesouro, dentro de mim eu poder ter,
por estares sempre ao meu lado... solidão.
(Eduardo Mesquita)

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Abro-me ao mundo...

Sonhando vou por aí,
sinto-me entre a terra e o céu!
Percorro montes e vales,
rios e oceanos,
países e continentes.
E o que vejo?
*
Fome e miséria,
iminentes mortes.
Bem-estar,
muito bem-estar,
ignorando os carentes.
*
Atroz egoísmo
num planeta com guerras,
ódios, invejas;
amor onde páras?
*
O sonho vai partindo
e deixa-me a imagem
de que existem dois mundos!!!
(José Manuel Brazão)

domingo, 12 de outubro de 2008

Nascer do Sol


Por detrás das grades vi uma claridade,
que fez no meu peito nascer uma esperanca,
senti que poderia terminar a tempestade,
e que finalmente chegaria a bonança.
*
Foi como um elixir, uma sagrada dança,
com rituais bordados pela ansiedade,
foi como se um feiticeiro, chegasse a verdade,
sem ter que manejar, a sua "sábia lança".
*
Foi um raio de luz, que entrou no meu mundo,
e reacendeu de novo a minha alma,
que caíra num precipício bem fundo.
*
Bastou um momento, minha voz se acalma,
com esse resplandecente suspiro e profundo .
Nasceu mais um dia, numa manhã calma.
(Eduardo Mesquita)