terça-feira, 13 de abril de 2010

Alegoria floral


Um dia em que a mulher nasça do caule da roseira
que cresce no quintal; ou um dia em que a nuvem
desça do céu para vestir de névoa os seus seios de flor:
seguirei o caminho da água nos canteiros
que me levam ao caule,
e meter-me-eipela terra em busca da raíz.
Nesse dia em que os cabelos da mulher
se confundirem com os fios luminosos
que o sol faz passar pela folhagem;
e em que um perfume de pólen se derramar
no ar liberto da névoa:
procurarei o fundo dos seus olhos,
onde corre uma tranparência de ribeiro.
Um dia irei tirar essa mulher de dentro da flor,
despi-la das suas pétalas, e emprestar-lhe
o véu da madrugada.
Então, vendo-a nascer com o dia,
desenharei nuvens com a cor dos seus lábios,
e empurrá-las-ei para o mar com o vento brando
da sua respiração.
Depois, cobrirei essa mulher que nasceu da roseira
com o lençol celeste; e vê-la-ei adormecer,
como um botão de rosa, esperando que a nuvem desça do céu
para a roubar ao sonho da flor.
***
(Nuno Júdice)

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