quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Vôo sobre fogo


Poemas são pássaros,
palavras, passo a passo, à disposição do acaso
ou desvelando indesejáveis verdades
Sem alarde - silencioso sofrimento -
passam no fim de tarde - sílabas de poente solidão -
aquarelando saudades nunca imaginadas...
*
Destino já não há, apenas um eterno seguir
Seguir em busca da idealizada liberdade sob o sol
E não importa o tempo, entregue ao vento,
o intento só perderá seu alento
quando a montanha transformar-se em pó
*
Estes pássaros-poemas, voando a esmo neste espaço,
são refrações, significâncias pouco traduzíveis...
Letras que se desprendem de uma triste história
e despencam nesta cinza tarde de inverno
A memória traz quadros de onde fogem figuras
e o que permanece são vazias e inquietantes molduras
Estes pássaros, em meio a tantas tormentas,
já não acreditam ser possível encontrar o oásis
O verdadeiro porto-seguro é o invisível vôo,
pois o futuro - olhos fechados - tropeça em coisas e pessoas
*
O cansaço é mais uma peça pregada pelo destino
E por mais que precisem e tentem, regresso já não,
Pois - nas nuvens - apagadas foram todas as pegadas
Por entre as últimas réstias do sol,
aos pássaros só resta alçar mais um vôo pelos desvãos do céu
Mas com eles também pesadamente vão
a certeza de desperdício e o completo desencanto
*
Não tem talvez: estes pássaros-poemas sou eu mesmo,
Mergulhando, sem qualquer preocupação com a volta,
profundamente no dilema da vez.
***
(Raimundo Gadelha)

2 comentários:

josé luís disse...

apetece dizer como na canção:

"escrever e voar é preciso/
viver não é preciso"...

Cristiana disse...

Os seus comentários são como as palavras certas nos momentos certos.
Obrigada :-)